Maradona: A minha homenagem
Texto & Fotos de Mário Menezes
Maradona deixou-nos recentemente. Partiu cedo. A vida fora dos relvados, a sua dependência do álcool e das drogas levaram-no à destruição. Viveu a vida ao máximo. Dizia verdades inconvenientes. Teve conflitos com todo o Mundo, com a FIFA, até com o Papa. Amigo de Fidel Castro, tinha Che Guevara, seu ídolo tatuado no corpo. Um rebelde! Mas foi dentro das quatro linhas que nos encantou com o seu futebol. Aquele pé esquerdo fazia obras de arte. Do “alto” do seu 1,65m e com alguns quilos a mais jogava que se fartava. O Mundo do futebol rendeu-se ao seu talento. Considerado por muitos como o melhor jogador de futebol de todos os tempos, todas as estrelas se tombavam perante ele. Ao pé de Maradona, Cristiano Ronaldo, Messi, ou qualquer outro são o “comum dos mortais”.
Maradona fez as delícias da minha adolescência. Foi com ele que comecei a ver e a gostar de futebol. Ao futebol, há mais de trinta anos vou regularmente aos estádios. Ver jogos mas também sempre que posso visito os grandes palcos nas viagens que vou fazendo. Orgulho-me de já ter visto ao vivo alguns dos melhores jogadores de futebol do Mundo a executarem a sua arte, mas infelizmente não tive a oportunidade de ver jogar Maradona ao vivo. Nem tão somente vê-lo em pessoa! Uma das poucas personalidades, com quem se acidentalmente me cruzasse na rua lhe faria uma vénia e me ajoelharia perante ele.
Em Janeiro de 2008 quando estive em Nápoles tive oportunidade de prestar tributo a este senhor. Quando visitei o Estádio San Paolo, posei em frente à baliza onde a passagem às meias-finais foi decidida a favor da Argentina, com Maradona a converter um dos penáltis. A Itália que organizara o torneio, tornou-se uma nação em lágrimas. E dizem que foi aí que começou a perseguição da FIFA a Maradona, o princípio do fim da sua carreira. Ele acabara de estragar à FIFA, os planos da “final conveniente”, Itália-Alemanha.
Em Janeiro deste ano visitei a Argentina onde aproveitei para ver de perto dois dos mais importantes estádios de futebol do Mundo e prestar o meu tributo a este ídolo. O La Bombonera, casa do Boca Juniores e o Monumental, casa do River Plate e também da Seleção Nacional Argentina de futebol. Dois dos muitos palcos palcos onde brilhou Maradona.
No primeiro com a camisola do seu clube do coração e no segundo sobretudo com a camisola “Albiceleste”.
No final dessa viagem com a passagem por Montevideo, no Museu do futebol, tive oportunidade de ver uma camisola que Maradona utilizou.
Estádio Monumental Antonio Vespucio Liberti – “Monumental”
Parte do dia do meu 45º aniversário foi aqui passado. Conhecido como “Monumental” ou mesmo “Monumental de Nuñez”. Localiza-se no bairro de Belgrano, vizinho do bairro Nuñez, bairros associados à classe alta da sociedade Argentina. É a casa do River Plate, clube conhecido como “Os Milionários”, e da Seleção Nacional Argentina de futebol. É o maior estádio do país, com cerca de 71.000 lugares.
A Seleção Argentina de futebol em 1978 sagrou-se ali campeã do Mundo. A Argentina foi sede desse torneio. Mario Kempes, foi o melhor marcador e brilhou nesse jogo ao marcar dois golos da vitória contra a Holanda, no prolongamento. A outra grande conquista da “Albiceleste ” aconteceu 8 anos depois no Mundial do México, pela mão (literalmente) de Diego Maradona. E foi aí a sua consagração definitiva como um Deus do futebol Mundial. A qualificação para esse campeonato do Mundo teve aqui 3 jogos, onde “El Pibe” também brilhou!
A visita ao estádio, engloba o museu do River Plate.
A entrada para o museu é feita por um túnel, a linha do tempo, que nos mostra a História deste gigante das Américas e das suas grandes conquistas. Mais à frente podemos ver as Taças Libertadores, uma delas conquistada recentemente em Madrid no Estádio Santiago Bernabéu, em 2018, numa finalíssima, frente ao grande rival Boca Juniors.
O River plate desceu de divisão pela primeira vez no seu historial, no ano de 2011. Renasceu literalmente das cinzas e em 2014 ganhou tudo! A Copa Sul-Americana e no ano seguinte a Copa Libertadores. Como dizem os seus adeptos, “River vuelve a ser River”.
Alguns dos craques que ali brilharam, destacam-se Saviola, Aimar, Falcão, Enzo Francescoli, Ariel Ortega, David Trezeguet, Marcelo Salas ou Alfredo Di Stéfano, cujos nomes têm várias referências no Museu.
E este clube não foi só de futebol. Por exemplo, a tenista Gabriela Sabatini, que nos anos 80 fez furor em torneios do Grand Slam, não é esquecida no Museu do River Plate, pois começou ali a carreira.
A visita ao estádio também é soberba e deixa qualquer adepto em êxtase. É possível chegar perto da relva, sentar no banco de suplentes, nas bancadas, nos balneários e também e passar no túnel de acesso. Quem gosta de futebol sente essa felicidade isso como ninguém!
Registo que não paguei visita. Disse que era o meu aniversário. Pediram-me para comprovar, mostrei o passaporte! Fica a dica!
Estádio Alberto José Armando – “La Bombonera”
Mais um palco mítico. Nos dias que correm devido à recente morte de Maradona, é provavelmente o Estádio mais importante do Mundo. Estádio Alberto José Armando, mundialmente conhecido como La Bombonera, devido à sua forma se assemelhar uma caixa de bombons. Fica localizado no famoso bairro “El Caminito”, local de enorme romaria de turistas que visitam a capital Porteña. Bairro Portuário, ligado à classe operária de parcos recursos económicos, antigos emigrantes de origem Europeia, trabalhadores braçais e humildes. Caminito também imortalizado no Tango, um género musical que (diz-se) nasceu num bordel, por aquela região nas margens do Rio La Plata. De noite é perigoso e altamente desaconselhado andar por ali, mas durante o dia é fortemente policiado o que o torna aparentemente seguro para visitar sem recorrer a tours organizados. As casas típicas coloridas dão-lhe a sua magia tradicional e memorável. Contraste com as zonas ricas de Buenos Aires como é o caso dos bairros de Palermo, Recoleta, Nuñez ou Belgrano.
Por El Caminito a arte urbana enche as paredes das casas e o futebol é rei.
Presente nos murais das paredes está Juan Román Riquelme, um ídolo, um dos grandes jogadores do Boca Juniors, o único clube onde foi feliz, pois quando se transferiu para Barcelona não correspondeu às expectativas, indo mais tarde parar ao modesto Villareal e à sua “dream team” de Diego Forlan (que não deixou saudades no Manchester United) e companhia, fazendo furor na época 2005/2006 na Champions League, cruzando-se com o Benfica na fase de grupos e quase chegando à final.
E Maradona, celebrando um golo perante a Inglaterra, vingando no futebol a derrota sofrida pela sua nação na guerra da Malvinas, e erguendo a Taça do Mundo em 1986.
À entrada de uma loja de souvenirs, junto ao estádio, estão várias estátuas coloridas de jogadores famosos com as quais podemos posar. Maradona como não poderia deixar de ser. Sentado ao lado de Martin Palermo, um avançado de grande qualidade mas que também ficou com o seu nome escrito no “Guinness book of records” pelas piores razões, pois falhou três penaltys num jogo em 1999 da Copa América, ao serviço da Argentina numa pesada derrota 3-0 frente à Colômbia. No ano seguinte contribuiu para que o Boca Juniors vencesse a Taça Intercontinental, em Tóquio, contra os “Galácticos” do Real Madrid, Figo incluído, marcando os dois golos da vitória logo nos primeiros seis minutos de jogo. Carlos Tevez, nascido em “Fuerte Apache”, outro bairro pobre e violento da área metropolitana de Buenos Aires, cuja sua biografia recentemente deu origem a uma série da Netflix. Um rapaz humilde cujo sonho era jogar na Bombonera e isso o fez escapar do mundo do crime, ao contrário de um seu grande amigo, que tinha ainda muito mais talento para o futebol, mas a vida marginal o desviou e morreu durante uma rusga policial.
A casa do “Club Atlético Boca Juniors”, o clube do coração de Diego Maradona.
Maradona, criado no bairro pobre de Villa Fiorito iniciou a carreira no “Argentinos Juniors” jogando depois no “Boca” e daí se transferiu para Europa. E foi no “Boca” que terminou a carreira. La Bombonera, estádio de conceção muito particular, pois tem uma parte de bancadas laterais, onde os camarotes predominam, fazendo lembrar a fachada de um prédio. O camarote onde Diego Maradona assistia aos jogos faz parte. Recentemente para o homenagear, durante a noite todas as luzes do estádio estiveram apagadas e apenas foi mantida acesa a luz do camarote de Maradona.
“Boca” que inicialmente equipava de preto e branco. Consideradas enfadonhas essas cores pelos seus fundadores, posteriormente azul e amarelo passaram a serem utilizadas. Alguém teve a ideia de ir para o junto da zona portuária e esperar que passasse um barco e perante isso decidiram que cores iriam utilizar no equipamento. Passou então um barco da Suécia. Imagine-se se tem passado um barco do Japão…
A visita guiada ao estádio é acompanhada por uma guia que vive com paixão o que faz, e ama aquele clube do fundo do coração! E tal como no dia anterior na visita ao rival River Plate a guia era super efusiva. Os Sul Americanos são tidos como os adeptos mais ferrenhos do Mundo!
Ela começou por explicar que ao “Boca” todos têm de fazer uma vénia porque ele é o maior clube do Mundo. Por exemplo, no balneário da equipa visitante, a porta de entrada encontra-se rebaixada, e para passar por ela é necessário baixar a cabeça. Todos os que ali vão têm de se curvar perante o “Boca” e isso terão de fazer os adversários logo quando descem do autocarro e entram no estádio. Este balneário localiza-se por baixo da “grada”, são chamadas as bancadas que ficam atrás das balizas onde as celebrações de golo são famosas. Ali assistem aos jogos os adeptos mais fervorosos que são incitados a bater com os pés no chão para causar estrondo e causar respeito aos jogadores adversários quando se estão a equipar para subirem ao relvado. E dada a acústica daquele estádio, todos os visitantes são convidados a gritar em conjunto “gooooolo” e sentirem os efeitos de assistirem ali na grada a um jogo. Com o estádio cheio é audível a vários quilómetros, em vários locais famosos da cidade como o Bairro de San Telmo nas proximidades do Obelisco da Avenida 9 de Julho.
Ir à bola na Argentina, não sendo sócio de um destes clubes é muito difícil, pois os bilhetes só são vendidos a sócios. Nos estádios não existem adeptos do clube visitante por questões de segurança. Apesar de tudo é possível aos turistas estrangeiros, comprarem bilhetes para jogos em agências turísticas, mas os preços são exorbitantes, na ordem dos 60€ por uma “grada”!
Adeptos do Boca Juniors, não se recomendam. Eles são chamados de “Bosteros” pelos adeptos do rival River Plate pois, segundo eles “só vão ao Monumental com a Federal”, a polícia de choque.
A visita aos estádios inclui também balneários, bancadas e relvado mas fora das quatro linhas. Qualquer amante do Desporto rei ao pisar os locais onde os seus ídolos passam, sente-se no paraíso!
O Museu do clube, no interior do estádio, “Museo de la Pasión Boquense” é um verdadeiro tributo ao futebol. Os troféus conquistados pelo Boca Juniores, vários vídeos que passam em vários ecrãs e numa pequena sala de cinema com ecrã a 360º, a História deste clube que é indissociável do bairro El Caminito. Maradona, como não poderia deixar de ser, está presente em um grande mural, na escadaria e também uma estátua sua juntamente com outros jogadores míticos do Boca Juniors.
E foi com uma vénia à estátua deste Astro Argentino a que ninguém fica indiferente que dei por terminada esta visita maravilhosa e este sonho realizado de passar um dia na Bombonera.
Visitar a Bombonera e El Caminito é para muitos turistas que visitam Buenos Aires obrigatório e muitos o fazem mesmo não sendo grandes apreciadores e conhecedores de futebol.
Maradona. É impossível não lembrar! Ainda nos estamos a habituar à ideia que Maradona já não existe mais. Ele é uma figura que une os adeptos do desporto rei e ainda há pouco vimos nas televisões imagens de adeptos do “Boca” e do “River” abraçados a chorar de dor. Uma enorme perda para o povo Argentino, que ama e preserva como poucos os símbolos nacionais, mas também para todos nós, cidadãos do Mundo que nos divertimos a ver futebol.
E eu que me divirto imenso a viajar ou a ver um jogo de futebol, aproveito desta forma para prestar tributo e homenagem a Diego Armando Maradona, infelizmente a título póstumo, mas a vida é mesmo isto!
Escrevi este texto após a sua morte em 2020. Regressei a Nápoles em 2023. Visitei o Quartieri Spagnoli, um dos bairros típicos da cidade. Por lá Maradona está presente em cada canto e até nos souvenirs que não resisti trazer…
Links:
Maradona by Kusturica – trailer
Maradona – La Mano de Dios – música
Fuerte Apache – série (trailer)
Fuerte Apache – série (banda sonora)
O jogo em que Martin Palermo falhou 3 penáltis
Golo de Riquelme contra o River Plate e festa na grada
Golos de Martin Palermo na vitória sobre o Real Madrid em 2000
Celebração de golo na Bombonera
Homenagem do “Monumental” a Maradona
Homenagem de “LA Bombonera” a Maradona
Itália-Argentina (Mundial 1990) – resumo
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