Istambul – Quatro dias de sonho entre dois Continentes
Texto & Fotos de Mário Menezes
“O Expresso da meia noite” foi o filme que mais me marcou. Altamente perturbador. A ação decorre em Istambul, apesar da maior parte ter sido filmada em Malta. O filme que é baseado em factos reais tem várias partes adulteradas.
Ser preso no estrangeiro é certamente dos piores horrores que alguém pode sofrer. Num ápice uma viagem de sonho transforma-se num enorme inferno. Longe de casa, num país corrupto, xenófobo, de baixos ordenados, onde as prisões são insalubres e desrespeitadoras dos direitos humanos e os maus tratos são a rotina diária. Onde os advogados de defesa são manipulados, leia-se comprados, pelo sistema de Justiça. Foi esta a imagem da Turquia que o realizador Alan Parker em 1978 trouxe para o Mundo. Mais tarde veio a retratar-se perante a nação Turca, mas já era tarde demais.
A história de um estudante Americano, “Billy Hayes” jovem, inocente e ingénuo que no final das férias, resolveu transportar consigo no avião de regresso a casa, haxixe colado ao corpo, para vender aos amigos. É detido em flagrante no aeroporto. Interrogado e transportado para a prisão. À chegada começa a perceber a gravidade do crime que cometeu, pois encontra vários estrangeiros que cumpriam penas longas devido a delitos relacionados com droga. Julgado e condenado a uma pena por posse de estupefacientes, de pouco mais de 4 anos de prisão. A meses da liberdade, é-lhe comunicado que o julgamento foi anulado e irá novamente ser julgado, mas desta vez por tráfico de droga, enfrentando uma pena de prisão perpétua. A pena de 30 anos que vem a ser condenado na prática acaba por ser uma pena perpétua, pois as condições vividas na cadeia, a tortura física e psicológica por parte dos guardas, levá-lo-iam à morte ou à loucura. Consegue fugir, o que na gíria prisional significava apanhar “o Expresso da Meia Noite”. Uma história aterradora que nos deve servir de lição.
Durante muitos anos a Turquia foi país que era eu incapaz de visitar. Só o título “O Expresso da Meia Noite” e a sua banda sonora causava-me arrepios.
Nem só de filmes Americanos vive a “7ª arte”. Durante muitos anos, nas décadas de 70 e 80, “Hollywood” denegriu, propositadamente ou não a imagem de vários países. De religião Muçulmana também. Talvez para enaltecer os EUA rebaixando os outros países, que os consideram inferiores, e o caráter dos seus povos. Por exemplo, o Irão, o Afeganistão, o Vietname, a China, a URSS e o Leste Europeu. A Turquia também comeu por tabela.
Um dos mais luxuosos hotéis de Istambul, o “4 Seasons de Sultanahmet”, foi em tempos uma prisão famosa. Ali “Billy Hayes” começou a cumprir a sua pena, na história real de “Expresso da meia noite”. Billy Hayes” recentemente regressou a Istambul e fez as pazes com o povo Turco, dando azo a um filme documentário, “Midnight return”. Billy Hayes sempre se mostrou contra a forma como o filme explora o seu caso de vida, sobretudo o ódio que a personagem tinha à Nação Turca e ao seu povo. Não, não dormi no “4 Seasons”, mas amavelmente permitiram que visitasse o interior e não levaram a mal quando lhes disse que foi por causa do “Expresso da meia noite”!!!!!!
Visitei Istambul durante 4 dias no regresso de uma tournée pela Índia onde comemorei os 43 anos. O melhor desta viagem foi mesmo guardado para o fim.
Istambul é um local mágico que nos cativa desde o primeiro instante. Ali o pôr do sol tem outro encanto. A comida turca que provei, os “kebabs” e as espetadas de carne,chamadas de “brochetas”, com pão turco (pita) e arroz, é deliciosa e os “baclavas”, chamados de “delícias turcas”, são super doces. As ruas estão cheias de gatos lindíssimos, alguns de pêlo comprido e muitos nem fogem dos transeuntes, ou não seja o gato um animal respeitado pelos Muçulmanos. A cidade faz lembrar Lisboa, sendo inclusivamente também chamada de “Cidade de 7 colinas” que por acaso, até parecem que são banhadas por um Rio Tejo qualquer. Foi esse o motivo que Calouste Gulbenkian, um Arménio, que ali nasceu, escolheu Lisboa para viver.
Istambul é gigantesco, apesar dos pontos principais se concentrarem a curta distância, maioritariamente na parte Europeia, a mais antiga e mais importante, mas a pequena. Uma cidade com mais de 15 milhões de habitantes, situa-se em dois continentes, Europa e Ásia, separados pelo Bósforo, um estreito que liga o Mar Negro ao Mar de Mármara, atravessado por várias pontes suspensas ao estilo da nossa “Ponte 25 de Abril” e também por túneis, por exemplo, um ferroviário, o “Marmaray Tüneli” e um rodoviário, o “Avrasya Tüneli”. Na Europa, um continente que não se carateriza por albergar “megacidades”, só Moscovo lhe pode fazer frente, inclusivamente ultrapassa-a em tamanho mas não em população. Para a cidade de Lisboa ter a dimensão de Istambul, teria que começar, talvez…no Cabo da Roca e terminar talvez…no Carregado, e também albergar talvez…toda a margem sul até Setúbal.
Istambul assim chamada desde 1930, já se chamou Bizâncio e depois Constantinopla, tem uma história riquíssima. É das cidades mais antigas do Mundo. Já foi capital do Império Romano do Oriente e do Império Otomano. Atualmente não é capital, pois a mesma é Ankara. A História escrita por aquelas paragens também fala de sultões, haréns e eunucos! A poligamia fazia parte desta cultura, e ainda é aceite e largamente praticada nos países Muçulmanos.
Istambul tem uma rede de transportes moderna, eficiente e fácil de utilizar. Além das linhas de barcos (ferry boats ou catamarãs) que a tornam a maior cidade do Mundo em número de carreiras deste tipo de transporte urbano, de metropolitano, que inclusivamente atravessam o Bósforo, funiculares, teleféricos, autocarros e elétricos rápidos, os “tram” . E descendo do “tram” na paragem de “Sultanahmet”, chegamos ao local mais central de Istambul. O distrito de Fatih. Todos os dias da nossa estada, obrigatoriamente passam por ali.
Das muitas mesquitas que compõem a cidade, dado a sua religião predominante Muçulmana, destaca-se a Mesquita Sultão Ahmed (Sultanahmet Camii), também chamada de Mesquita Azul, com os seus seis minaretes, é um dos cartões postais da cidade. O seu interior com os 20.000 azulejos azuis que adornam a cúpula e a parte superior da mesquita, tal como os mais de 200 vitrais e lustres pendurados no teto que o iluminam, é impressionante.
A Santa Sofia (Hagia Sophia) é outra das mesquitas importantes de Istambul. Já foi um templo de Religião Ortodoxa, posteriormente Católica e atualmente Muçulmana. Recentemente deixou de ser tido como um museu a passou novamente a ser local de culto.
O Palácio de Topkapi que foi residência dos sultões durante quatro séculos. As vistas desde os seus balcões são impressionantes. Um dos pontos mais altos de qualquer visita a Istambul. Vistas sublimes para a zona Europeia, para a zona Asiática e para o Bósforo, onde podemos posar com os dois continentes: ao nosso lado direito a Ásia, à esquerda a Europa.
Os bazares típicos de Istambul, o Bazar Egípcio (ou das especiarias) junto à Ponte de Gálata, que divide duas margens Europeias, atravessando o estuário do Corno de Ouro, e o “Grande Bazar” ,tido como o maior e mais antigo mercado coberto do Mundo, chegando a receber cerca de 400 000 pessoas diariamente onde trabalham cerca de 20.000 pessoas. Naquele labirinto de bancas, sobressai a zona onde se vende ouro.
Na Ponte de Gálata, um dos locais onde o pôr do sol nos encanta como em poucos lugares, e onde muitos locais pescam, existem inúmeros restaurantes onde o peixe é rei, nomeadamente as cavalas. A poucos metros termina a rota do “Expresso do Oriente” na Estação de Sirkeci. E ali também se localizam terminais marítimos como o de Yenikapi que nos permite viajar para outros pontos da cidade, fazer cruzeiros no Bósforo e inclusivamente visitar locais bem longínquos como Bursa, pagando muito pouco! Yenikapi também é nome de uma estação de metropolitano. A linha que cruza o Bósforo e passa por Üsküdar, local de nascimento de Calouste Gulbenkian e que se localiza já no continente Ásiatico. Regressar de ferry ou de catamarã ao lado Europeu é uma boa opção. Até parece que viemos de Lisboa a Cacilhas por baixo do Tejo e vamos regressar de Cacilheiro!
Atravessando a Ponte de Gálata encontramos a famosa Torre de Gálata, uma famosa construção medieval cujas vistas do topo são um encanto. A chuva que nesse dia caiu estragou-me os planos e não visitei.
A Torre Gálata fica localizada no no distrito de Beyoğlu, a qual pertence o famoso bairro de Galatasaray. Ali se situa a célebre Praça Taksim, onde pelas manifestações e tumultos sociais são levados a cabo. O famoso elétrico “Nostalgic İstiklal Caddesi Tram” ainda ao jeito antepassado, percorre a Avenida İstiklal. Um bairro que constitui uma zona comercial e de grande animação noturna, e por conseguinte de grande romaria.
Passear de barco pelo Bósforo é uma experiência fascinante e obrigatória. Saindo e regressando de Yenikapi e passando sob as diversas pontes suspensas intercontinentais, e também junto à Torre de Leandro que se localiza numa ilha.
E numa manhã chuvosa o Palácio Dolmabahçe foi programa. Situado no distrito de Besiktas, nas margens do Bósforo, com vista para a Ásia é um dos mais importantes pontos turísticos. Também chamado de “Versailles de Istambul” devido à sua arquitetura inspirada em estilos Europeus. No interior, não é permitido tirar fotos. Ele divide-se em duas partes :a do Selamlik, a mais importante porque abriga as dependências administrativas e os salões oficiais, onde se destacam a Escada de Cristal e o Salão do Trono, e a do Harém é onde se encontram as dependências privadas do Sultão e sua família, parte do palácio implica um pagamento extra no bilhete de entrada.
Mustafa Kemal Atatürk, fundador e primeiro Presidente da República da Turquia, viveu no Palácio Dolmabahçe os seus últimos dias. Atatürk faleceu às 9h05min de 10 de novembro de 1938, num quarto que se pode visitar.
O povo Turco é na generalidade muito reservado no trato com estranhos, e poucas pessoas falam Inglês, sobretudo muitos que abordamos nas ruas a solicitar informações. Mas é tido como um povo de “sangue quente”. Exemplo disso são os tumultos sociais que são recorrentes, e o facto da Turquia tratar-se do país com os adeptos de futebol mais fanáticos e mais perigosos das equipas que competem nas provas Europeias. Para assistir a um jogo na Turquia é necessário ter um cartão de adepto, denominado “Passolig” por questões de segurança pública. É com esse cartão que se adquirem os bilhetes para os jogos e é somente com esse cartão que se entra nos estádios para assistir aos jogos. Tentei em vão assistir a um jogo do Galatasaray. No Estádio Türk Telekom, o novo estádio, que substituiu o Estádio Ali Sami Yen entretanto demolido, não passei dos portões exteriores. Sem esse cartão “Passolig” não se conseguem mesmo comprar bilhetes. Só a experiência de viajar no metro com os adeptos em euforia e dando largas à sua brutalidade, deu para ter uma ideia de como se devem comportar no estádio.
O Galatasaray é um dos clubes grandes de Istambul, o maior de todos, o Beşiktaş outro, ambos se situam no lado Europeu da cidade e o Fenerbahçe que se situa no lado Asiático é o terceiro grande. O İstanbul Başakşehir é um clube jovem, fundado em 1990 que recentemente saltou para a ribalta e é o “quarto grande”, sendo atualmente campeão Turco. Também se situa na parte Europeia da cidade. Todos estes clubes jogam em estádios de futebol modernos.
Em Istambul dei azo à minha paixão por estádios de futebol e visitei dois grandes palcos:
O Estádio Ataturk palco da mítica final da Champions League de 2005, estando indicado pela UEFA para acolher a final de 2021. Recebe jogos da Seleção Turca de Futebol e também diversos eventos extra futebol. Não é aberto a visitas, mas segurança deixou-me amavelmente entrar e tirar fotografias e dei por muito bem empregue o tempo perdido em deslocações pois localiza-se cerca de 25 Km da zona central da cidade.
O Estádio do Beşiktaş agora chamado de Vodafone Park (já foi chamado de Vodafone Arena) localiza-se muito perto do Palácio Dolmabahçe, foi o outro que tive oportunidade de visitar. Um tour com guia, a um palco moderno inaugurado em 2016. As bancadas, o terreno de jogo, os balneários, os camarotes de imprensa, a sala de imprensa, e o museu do clube fizeram parte.
Na altura o Beşiktaş era o detentor do título de campeão Nacional. Contava no plantel com Pepe, Quaresma, Aboubakar e Talisca. O Talisca que estava emprestado pelo Benfica. Um jogador de enorme talento mas com pouco juízo e com uma grande falta de caráter e ingratidão. Muito acarinhado pelos adeptos do Beşiktaş que passavam no museu ininterruptamente num ecrã do museu, o golo do empate, que ele havia marcado no Estádio da Luz, no último minuto, de livre direto, num jogo da Champions League, em 2016 e que o festejou efusivamente, levando à loucura os adeptos do Beşiktaş presentes no 4º anel e à raiva e frustração dos Benfiquistas no resto do estádio. Muitos jamais o querem ver de novo a vestir o “manto sagrado”. Eu gostaria imenso de o voltar a ver de “vermelho e branco” e não deixei de marcar esse pedido na minha visita ao Museu. Talisca foi um jogador fundamental na conquista do campeonato Nacional de 2016 pelo meu clube. Aquele golo na Madeira, na penúltima jornada, ao Marítimo selou a nossa vitória e talvez o título de campeão nessa época.
A Istambul espero um dia voltar. É um local que está na rota de várias viagens que posso fazer para o Continente Asiático ou mesmo para o “Velho Continente”, para a Cáucaso dos Mares Negro e Cáspio que anseio visitar. De Istambul para todo o Mundo voa a Turkish Airlines, Lisboa incluída, e uma escala de alguns dias em Istambul não encarece o preço de uma passagem aérea nesta excelente companhia aérea de cuja música de fundo que ouvia ao entrar no avião jamais esquecerei.
Links:
O Expresso da meia noite (1978) – trailer oficial
Presos no Estrangeiro – O expresso da meia-noite – documentário da National Geograpic
Midnight Return (Trailer)
The Four Lads – Istanbul (not Constantinople)
Kedi (2017) – Gatos de Istambul – filme documentário – 1ªparte
Kedi (2017) – Gatos de Istambul – filme documentário – 2ªparte
Golo de Talisca ao Benfica com relato emocionante em Turco
Turkish Airlines – música de embarque com imagens de Istambul
Alojamento económico
O Neverlando hostel fica situado no distrito de Beyoğlu, nas imediações da praça Taksim. Económico sobretudo e frequentado por vários viajantes jovens. Ambiente descontraído e amistoso. Staff simpático e atencioso.
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