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12 Dez

DE VOLTA AO BAIRRO ALTO

 

DE VOLTA AO BAIRRO ALTO

Casa de artistas e boémios num passado recente, o Bairro Alto, que continua a manter o seu carácter típico e histórico, continua activo e recomenda-se.

Lembro-me de passar boa parte da minha juventude neste bairro, já nos final da década de 80, onde eram frequentes as visitas ao “Frágil”, “Três Pastorinhos” e mais tarde “Capitan Kirk”. Mas eis que surgem novos desafios, oportunidades laborais e, claro está, destinos para copos. O interesse pelo bairro esmoreceu-se. Passaram-se mais de 10 anos sem que voltasse ao outrora chamado “Vila Nova dos Andrades” e só muito recentemente, ao participar numa ou outra incursão nocturna, decidi que estava na hora de voltar e ver o que mudou. Este é pois o momento de voltar a reviver as emoções do Bairro…

Subo pela Rua da Atalaia, que continua exemplarmente revestida com o tradicional basalto negro. Em diversos locais, corre água envolta numa espuma muito branca, que resulta das limpezas matinais de bares e restaurantes: a estrada parece ter sido lavada pela cerveja que na noite anterior, abundantemente, terá escorrido pelas gargantas sôfregas de milhares de pessoas. Aliás, os resquícios de uma noite animada – porventura de excessos – são perfeitamente visíveis através dos copos e garrafas que abundam pelos caixotes, ombreiras de janelas, soleiras de portas ou nos mais variados recantos.

bairro alto

Algo mudou e a ausência de tráfego automóvel é notória: à excepção de uma ou outra via, o trânsito de outrora foi afastado das ruas pelo Município. O bairro tornou-se agora num imenso espaço pedestre, onde apenas os moradores podem fazer circular os seus veículos.

A afamada Rua do Norte, está repleta de lojas de arte, moda, étnicas, tatuagens, músicas e, imagine-se, até os Cupcakes – aqueles bolos cheios de creme celebrizados em “O Sexo e a Cidade” – já aqui chegaram. Já uma das suas “irmãs gémeas”, a Rua da Rosa, recebeu cabeleireiros que fazem cortes extravagantes ou lojas alternativas de acessórios graffiti, que sadiamente ombreiam com as mercearias castiças que a memória não soube apagar. Trata-se de um comércio que, embora não sendo destinado a massas, é direccionado a nichos específicos e onde a originalidade e novas tendências são olhadas de uma forma inovadora e moderna. É em parte por esta vertente vanguardista que se tem vindo a observar um novo movimento pendular de gentes, sem que o propósito exclusivo da visita seja o de copos ou comezainas.

bairro alto

O crescimento do turismo na cidade trouxe ao bairro mais de duas centenas de restaurantes, tascos, bares e afins. Os estilos contrastam-se e a abundância gastronómica percorre os antípodas do planeta. Para os ávidos em experiências gastronómicas, e para quem procura sabores fortes e exóticos, pode encontrar no bairro, além da tradicional cozinha portuguesa, verdadeiros e suculentos bifes argentinos, pizzas e pastas, dar um salto à Índia e experimentar um frango tandoori, ou passar pelo norte de África e comer um verdadeiro couscous marroquino.

Continuando a minha caminhada pelo Bairro, já com estalidos a fazerem-se sentir no estômago, apercebo-me que embora o potencial gastronómico seja grande, quase tudo está fechado. Decido então interpelar um transeunte, que caminhava apressadamente à minha frente. À minha pergunta sobre locais tradicionais para comer, responde: “Agora está tudo fechado! Como a maior parte dos restaurantes só abre durante a noite, o melhor é ir ao Chiado”. Ao que returco: “Mas se a senhora quisesse comer agora, onde iria?”. “Eu? Ia ali aos irmãos…”. “Óptimo! É aí mesmo que quero ir!”.

Por alguns instantes, sigo a senhora e dou de caras com um local esguio, de cheiro hortelã-pimenta, paredes ocre e de aspecto gorduroso. Despido de qualquer preconceito, sigo o ímpeto e avanço para o seu interior, sendo quase abalroado por duas crianças que saem disparadas e parecem jogar à “apanhada”. Já no interior, avisto uma empregada, que completamente indiferente à minha presença, lava tranquilamente os copos que escorrem directamente em prateleiras de vidro pregadas à parede.

Aproximo-me do balcão de vidro baço, rachado longitudinalmente e volto a sorrir. Peço um rissol, uma sandes de presunto e uma imperial. Continuo a observar aquele local, e facilmente consigo estabelecer pontes com muitos dos locais que já visitei nestas viagens de andarilho. Durante alguns instantes, o meu pensamento esvoaça – tal como alguns dos pombos que por ali vão entrando e saindo –, mas rapidamente regressa com o ruído libertado por um dos funcionários enquanto cortava algumas fatias de uma gorda perna de presunto. Enquanto mordisco o rissol, que continua a escorrer um óleo meio enegrecido, aproveito para me intrometer na conversa da dupla que me olha com desconfiança.

O senhor Joaquim, morador no bairro há 45 anos, revela-se suficientemente efusivo para manter uma conversa extremamente agradável durante quase uma hora. Além de sublinhar, por mais do que uma vez, que não gostava do bairro e só lá veio parar por um mero acaso – as muitas vindas às “putas“ de então –, hoje reconhece ser a sua casa. Considera que o bairro já não é a mesma coisa e que tem medo de sair à noite, pois a “vadiagem” é muita. Queixa-se ainda do tráfico de droga, das torrentes nocturnas de gente, ou do barulho que não o deixa dormir.

Já o senhor Santos, vindo de Celorico da Beira, também morador no bairro à perto de cinco décadas, congratula-se com as árvores de fruto e o jardim que tem no pátio interior seu prédio. Lamenta-se, no entanto, do karaoke existente no R/C, do mijo nas esquinas, dos graffitis que não poupam nada, ou da crescente procura de espaços para arrendar, o que está a fazer subir de forma galopante as rendas das casas. Aparentemente, neste momento há uma procura quase incessante por parte de jovens, da classe média e até de alguns burgueses. Os espaços vão desde simples quartos, apartamentos remodelados, ou complexos luxuosos que podem custar vários milhões de euros.

A opinião dos dois é, no entanto, comum em dois aspectos: “neste momento já ninguém pede salsa ou o que quer que seja ao vizinho…”; “o bairro vai tornar-se num lugar de ricos e de romeiros para a folia nocturna.”.

Deixo o tasco e a dupla com os seus penaltis de ginja. Continuo sem qualquer destino e deixo-me perder nas ruas e ruelas. Procuro embrenhar-me no lado quase místico do bairro: é quase como mergulhar e não querer voltar à superfície; é o desejo em me manter numa espécie de transe emocional e deixar-me guiar pelas crianças que vejo brincarem na rua, pelos estendais de cores garridas, pelos idosos que falam de janela para janela, pelo fado que ecoa não sei bem de onde, ou pela estridente música heavy metal que sai de um 1º andar.

Do ponto de vista arquitectónico, o bairro continua com a traça que sempre o caracterizou ao longo das últimas décadas. Existem algumas dezenas de edifícios excessivamente degradados, ou mesmo em ruína, mas muitos outros sensatamente recuperados ou a caminho de o serem.

Há, no entanto, um ou outro excesso que, a multiplicar-se, pode ferir de morte a paisagem e identidade do bairro. Como seria de esperar, também aqui se fazem sentir a pressão e especulação imobiliária, pelo que urge a imposição de regras que protejam um património rico e representativo de umas das faces mais importantes do bairro. É necessário saber qual a matriz de desenvolvimento urbano que se quer para o bairro: é que não se trata exclusivamente da recuperação do edificado, mas sobretudo daquilo que é parte da génese e da alma do próprio bairro.

Há quem diga que o bairro está moribundo ou a morrer aos bocados. Não concordo! O bairro de hoje está afinal cheio de velhos, novos, estrangeiros e das mais variadas tribos urbanas. Pergunto: Será este “melting pot” de diversidade suficiente para catalisar uma nova e verdadeira identidade do bairro? Estou convencido que sim. Aquela que já foi chamada a “sétima colina” pulsa, nesta mescla de gentes, o gosto lacónico e universal por esta coisa única que é ser parte integrante do próprio bairro.

O Bairro Alto de hoje é um dos mais camaleónicos da cidade, continua vivo e cheio de pujança para marcar as próximas décadas de história da cidade.

bairro alto

– Texto de Agostinho Mendes –

Fotógrafo e Editor 

https://agostinhomendes.com

 

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